Trabalho
de fiscalização realizado por equipe de auditores do Tribunal de Contas apontou
inúmeras irregularidades na aplicação de recursos pela Câmara Municipal de
Natal como o uso de verbas indenizatórias para manutenção dos gabinetes dos
vereadores e gastos com serviços de interesse particular sem qualquer
finalidade pública. O relatório da auditoria, que irá ao plenário do TCE pelas
mãos do relator, conselheiro Poti Júnior, propõe que todos os vereadores
citados sejam obrigados a devolver o total de R$ 3,3 milhões, além da aplicação
de multa ao presidente, Franklin Capistrano e outros cinco vereadores por
diferentes gastos considerados irregulares.
Com
base nas irregularidades constatadas, o relatório elaborado pela equipe de
auditores propõe que o conselheiro relator conceda medida cautelar determinando
que a Câmara Municipal suspenda de imediato o pagamento de verbas
indenizatórias para manutenção dos gabinetes dos vereadores. No entendimento
dos auditores, a Câmara deve se restringir a fazer o pagamento apenas quando
ocorrer, de fato situação excepcional que justifique o ressarcimento.
O
relatório da auditoria também propõe que os vereadores sejam obrigados a
devolver o total de R$ 3.303.696,64 aos cofres públicos em face da
irregularidades praticadas na aplicação dos recursos. O documento final da
equipe de auditoria defende, ainda, a aplicação de multas aos vereadores
Franklin Capistrano (presidente da Câmara), Dickson Nasser Júnior, Júlio
Protásio, Adão Eridan, Hugo Manso e Eleika Bezerra.
VERBA DE GABINETE
A
equipe de auditoria apontou a indevida destinação de recursos financeiros aos
vereadores para custeio de despesas administrativas (verba de gabinete). A
verba indenizatória do exercício parlamentar foi instituída pela Câmara
Municipal do Natal em 2014 (lei 6.457, de 28 de abril de 2014) e regulamentada
pelos atos da Mesa Diretora nº 012/2014 (vigência de 1 de julho de 2014 a 30 de
setembro de 2015) e nº 031/2015, vigência a partir de 1 de outubro de 2015.
Os
atos regulamentaram que a verba indenizatória seria destinada exclusivamente a
ressarcir os vereadores por despesas realizadas no exercício do mandato
parlamentar até o limite máximo mensal equivalente a 75 por cento da verba
indenizatória percebida por um deputado estadual. Para o exercício de 2015, a
Câmara definiu expressamente no artigo 11 que o limite mensal para pagamento da
verba indenizatória seria de 18 mil reais.
Levantamento
feito pelos auditores constatou que a Câmara destinou no exercício de 2015
recursos da ordem de R$ 6.015.614,40. Os pagamentos de verba indenizatória
foram feitos regularmente aos vereadores titulares e eventuais suplentes,
totalizando 34 beneficiários ao longo de 2015.
Os
pagamentos deixaram de ter caráter de eventualidade para servir para o custeio
ordinário, corriqueiro e previsível da rotina administrativa dos gabinetes dos
parlamentares. Para os auditores, sobram evidências de que persiste o uso da
verba de gabinete, considerada irregular e ilegal, sob o disfarce da
nomenclatura de verba indenizatória e aparente caráter de ressarcimento.
Segundo
o relatório, tais despesas devem ser submetidas ao regular processo de
planejamento e execução pela administração da Câmara, sob pena de configurar
indevida descentralização orçamentário-financeira dos gastos públicos.
O
documento elaborado pelos auditores aponta que “tal situação implica na
transformação anômala de cada gabinete em uma unidade orçamentária autônoma e,
de certa forma, converte indevidamente cada parlamentar em um novo ordenador de
despesas, desfigurando o seu papel legislativo, em uma clara ingerência de
competências privativas da Presidência da Câmara”.
O
relatório lembra que decisão recente da Segunda Câmara de Contas do TCE-RN
suspendeu cautelarmente qualquer pagamento de verba para manutenção dos
gabinetes dos vereadores de Mossoró. A decisão foi consolidada com o Acórdão nº
110/2016-TC, embasado em relatório do Corpo Técnico e de acordo com parecer do
Ministério Público de Contas.
PROPAGANDA PESSOAL
A
equipe de auditoria constatou, ao examinar a prestação de contas das despesas
ressarcidas pelas verbas indenizatórias no exercício de 2015 que os vereadores
de Natal efetuaram individualmente despesas com publicidade e propaganda
pessoal, com R$ 1.797.787,49.
De
acordo com a legislação, a destinação de recursos públicos para despesas com
publicidade, no caso do Poder Legislativo, deve alcançar tão somente a atuação
do Parlamento (institucional) e não do parlamentar (pessoal). Esta determinação
legal tem base na Constituição Federal e na decisão do Supremo Tribunal Federal
quanto à aplicação do parágrafo 1º do artigo 37 da CF/1988. Este posicionamento
da corte suprema do País foi firmado no julgamento do Recurso Extraordinário nº
191.668.
MAIS GASTOS
Todas
as despesas encontram-se detalhadamente relacionadas no anexo I do relatório da
auditoria. O documento revela, por exemplo, que despesas com combustíveis,
lubrificantes, serviços e peças automotivas destinados a 109 veículos de
passeio, transporte coletivo e ambulâncias estão relacionadas no anexo II do
relatório da auditoria.
Cada
vereador utilizou a verba indenizatória para aquisição de combustível, peças e
serviços automotivos para, em média, cinco veículos. Detalhe: a Câmara dispõe
de apenas cinco automóveis em sua frota. O exame da relação dos veículos
cadastrados junto à Unidade de Controle Interno constatou que a maioria é de
propriedade dos vereadores ou pertencentes a parentes ou funcionários e
assessores ligados ao vereador e encontravam-se à disposição gratuita dos
gabinetes. Tal situação configura
verdadeiro contrato de locação de fato.
As
despesas com locação de veículos totalizaram 664 mil reais. Ao longo de 2015,
verificou-se a ocorrência do ressarcimento de despesas com a contratação de
assessoria jurídica e contábil e contratação de serviços de consultoria no
valor de 1 milhão 735 mil reais. Os valores pagos mensalmente por vereador
contratante oscilaram entre 400 reais e 6 mil reais, pagos a pessoas físicas e
jurídicas que, em alguns casos, estão impedidas de contratar com a
Administração Pública.